Mário Raposo, reitor da Universidade da Beira Interior, considera que uma nova fórmula de financiamento das instituições de ensino superior deve incluir diferentes fatores como a interioridade, ou a dispersão do campus universitário, para além do número de alunos, da qualidade da formação ministrada e que qualificação do corpo docente. Para já, diz que a abertura da ministra em rever a fórmula e a correção de 1% efetuada são um princípio.
O reitor faz ainda uma análise positiva ao trabalho realizado no âmbito da universidade europeia de que a instituição beirã foi fundadora. Em entrevista ao Ensino Magazine fala do reforço do alojamento para os estudantes da sua academia, através da recuperação de três residências e construção de uma nova.
A questão do financiamento das instituições de ensino superior continua a ser motivo de preocupação por parte das universidades. A ministra disse que se deve encontrar uma nova fórmula para o futuro. Está otimista?
É óbvio que é necessário fazer alguma coisa. Desde há uns anos a esta parte que a Universidade da Beira Interior tem vindo a alertar para o subfinanciamento do ensino superior e, em particular, para o subfinanciamento que a UBI tem sido sujeita ao longo dos últimos 10 anos. Este ano conseguiu-se, fruto de uma negociação e de uma demonstração junto do ministério, reforçar algumas instituições. Daí que o valor que foi atribuído ao ensino superior tem uma percentagem comum a todas as instituições (2,5%), depois tem 0,2% destinados a atualizar o corte das propinas imposto pelo Governo, e há 1% do orçamento que foi distribuído pelas instituições que têm sido mais prejudicadas ao longo dos últimos anos. A UBI apareceu como uma das instituições mais subfinanciadas, pelo que esse 1% veio traduzir-se numa verba de reforço ao orçamento. É um princípio. Temos que agradecer à tutela o ter trabalhado para este problema. Se me pergunta se é suficiente, obviamente que não. A UBI está subfinanciada em cerca de oito milhões de euros e vai receber cerca de um milhão de euros relativos ao tal 1%. A senhora ministra disse estar a trabalhar numa nova fórmula para 2024 e esperemos que o financiamento da UBI venha a obter mais um acréscimo aproximando-se dos valores que consideramos reais e devidos à universidade.
A UBI é uma universidade com a particularidade do seu campus ser a Covilhã, de abraçar a cidade. Esse é um dado que deve ser considerado nessa nova fórmula?
Claro. Instituições como a UBI, pelo facto de terem impacto em determinadas zonas do território, devem ver esse aspeto refletido. A UBI não tem um campus em que estejam todas as faculdades juntas. Ao nos ser solicitado que, ao criar algumas faculdades, recuperássemos edifícios devolutos (antigas fábricas) na cidade da Covilhã, isso traduz-se em custos (mais elevados), para além da necessidade de termos que duplicar serviços em cada uma das faculdades e de espalhar as residências de estudantes pela cidade. Por outro lado, estamos numa região em que no inverno é necessário aquecer os equipamentos e no verão arrafecê-los. Tudo isto aumenta os custos de contexto. Do mesmo modo, os custos da interioridade também devem ser tidos em conta. Além disso, há outros custos de contexto que devem ser tidos em conta, como a distância a que estamos de Lisboa e do Porto. Quando é preciso fazer viagens para o estrangeiro ou quando temos que ir a reuniões de trabalho que normalmente são em Lisboa, Porto ou no litoral, há as portagens e os custos com os combustíveis... Naturalmente que a questão da qualidade, qualificação do corpo docente e a aposta na sua qualificação também têm que ser considerados no futuro.
A UBI foi pioneira, no nosso país, na criação de uma universidade europeia. Qual o balanço que faz da UNITA?
É muito positivo. Convém referir que os dois primeiros anos foram feitos em pandemia. E esse facto atrasou um pouco as dinâmicas da mobilidade. Mas desde que acabaram os confinamentos e entrámos numa fase normal, têm-se multiplicado as ações entre as várias instituições. Neste momento estão a ser desenvolvidos programas de dupla titulação; iniciativas relacionadas com microcréditos; acreditações mútuas de unidades curriculares, ou investigação. Estamos a preparar uma nova candidatura para o período de 2024 a 2029, com a entrada de mais parceiros. Iremos continuar a trabalhar no sentido de a UNITA ser uma afirmação importante enquanto universidade europeia que recebeu financiamento da União Europeia e que está a responder positivamente ao valor que lhe foi atribuído.
A questão do alojamento é importante para a atratividade das IES. A UBI viu aprovado um projeto que prevê a renovação de três residências e a adaptação de um imóvel para uma outra. Este é um dos maiores investimentos feitos pela UBI nesta área nos últimos anos?
É um investimento muito importante. Desde que tomei posse, uma das minhas preocupações é a melhoria de alojamento que proporcionamos aos nossos estudantes. Os nossos edifícios começam a necessitar de remodelação, pelo que a melhoria e a recuperação das residências foi um objetivo. Fizemos um projeto que foi aprovado pelo PRR (Plano de Recuperação e Resiliência). Uma das residências tem a sua intervenção quase concluída. No entanto, há uma questão que deve ser vista com cuidado, e que diz respeito ao aumento do preço dos materiais. Isto faz com que os valores reais sejam muito diferentes do aprovados pelo PRR.
E como é que essa questão pode ser resolvida?
É um problema que teremos que analisar. Iremos chamar a atenção à tutela. Sabemos que o Primeiro Ministro tentou junto da União Europeia para que houvesse um atraso na execução do PRR, mas isso não foi possível. Mas tem que se encontrar uma solução para se aumentar o valor de financiamento por cama, pois as verbas são manifestamente insuficientes devido ao aumento do custo dos materiais. Nesta residência que já estamos a construir, os custos subiram 40% face ao orçamento inicial. De referir ainda que as exigências técnicas colocadas pelo PRR relacionadas com a eficiência energética e a utilização de materiais reciclados, obrigam a intervenções que também aumentam os custos.
Quando é que essas novas residências podem estar prontas a funcionar?
A nossa ideia é que todos os anos abríssemos uma, de modo a que quando uma ficasse concluída iniciássemos as obras na outra e assim sucessivamente até ao fim do PRR. Vamos procurar concretizá-las todas, mas não é fácil. Teremos que procurar alternativas para conseguir desenvolver estas obras que são fundamentais para o apoio aos estudantes e dar instalações condignas a quem nos procura. Neste momento estão a funcionar 550 camas. Mas a residência 3 vai abrir este ano e serão mais 44 camas que disponibilizaremos.
A UBI nos últimos anos tem tido boas taxas de entrada de alunos pelo Concurso Nacional de Acesso. Qual a expetativa para este ano?
Este ano houve um aumento no número de candidatos, pelo que se deverão manter as taxas de colocação dos anos anteriores. Todavia, não deixo de estar preocupado pelo facto do PRR ter permitido abrir no litoral um grande número de vagas em cursos que são diretamente concorrentes com as formações das instituições do interior do país. Nós sabemos que em Portugal as pessoas tem a mentalidade de estarem perto dos grandes centros e isso irá dificultar o preenchimento de vagas. Mas estou confiante em que iremos atingir os níveis do ano passado e assim manter o mesmo número de alunos na UBI.
Uma das suas apostas é a criação de um quadro de investigadores de carreira na UBI. Em que fase está esse processo?
Este ano propusemos já para o orçamento da universidade a criação do quadro com a abertura de duas vagas. Como é óbvio, com orçamentos curtos, não podemos começar este proccesso com grandes números. Mas a ideia é abrir as vagas à medida que os orçamentos forem sendo disponibilizados à universidade. Consideramos que os investigadores devem ter a sua carreira e tenham o seu percurso definido. Serão concursos públicos, onde serão escolhidos os melhores.
Este ano a UBI atribuiu o doutor Honoris Causa ao mestre Manuel Cargaleiro. Que significado isso tem para a universidade?
A UBI tem um ADN de ligação à região. Como eu digo, é uma universidade da região para o mundo. Manuel Cargaleiro é uma pessoa com um percurso invejável ao nível das artes, pelo que foi uma enorme justiça o departamento de artes ter proposto essa atribuição. Nada mais fizemos do que reconhecer a obra e o percurso de Manuel Cargaleiro, e devemos estar agradecidos por ele ter aceitado receber esta distinção. Nela juntámos o homem, o seu percurso e obra, e o facto da UBI ter uma enorme ligação às artes, através da Faculdade de Artes que tem tido uma grande projeção.