Muitas têm sido as vezes em que é colocada em debate a questão da desertificação do Interior, a par do êxodo rural, da emigração e de uma extensa faixa do território nacional cada vez mais abandonada. Apesar dos alertas constantes e de algumas soluções apresentadas por especialistas, poucas são aquelas que se efetivaram com algum êxito.
O êxodo para as grandes cidades, especialmente do litoral, continua a ser manifestamente excessivo, desequilibrando por completo os pratos da balança quando comparamos com o movimento inverso.
Lisboa e Porto estão no centro das escolhas para viver, não só dos portugueses, como também dos estrangeiros que têm migrado para o nosso país em grande número. As duas cidades recolhem a maioria das preferências, ainda que as estatísticas relacionadas com a qualidade de vida revelem fragilidades preocupantes.
Basta recordar, por exemplo, os custos absurdos da habitação, o tráfego automóvel muitas vezes caótico, um isolamento social cada vez mais acentuado, a saúde mental dos cidadãos que se deteriora perante a dura realidade, pessoas a caminharem para situações de limiar da pobreza, a questão da insegurança crescente, e muito mais!...
Em contrapartida, nas pequenas cidades, vilas e aldeias do Interior encontramos uma população envelhecida, com estruturas a degradarem-se, terras ao abandono, mas com uma série de oportunidades por explorar.
A habitação consegue-se a preços mais justos, o quotidiano torna-se menos stressante, as pessoas vivem mais em comunidade, o contacto com a natureza cria liberdade e promove uma grande melhoria na saúde e bem-estar.
Atendendo a que cerca de 1 milhão de pessoas se encontra atualmente em regime de teletrabalho, por efeito colateral da recente pandemia, surge uma excelente oportunidade de mudar o paradigma.
Mas o que fazem verdadeiramente os ditos defensores do Interior para evitar ou inverter a fuga para as grandes cidades?
A meu ver, alguns deles – não tão poucos quanto isso – fazem precisamente o oposto do que deveriam. Se não, vejamos: quantas das chamadas famílias de “bem” se queixam da falta de investimento na sua região, e depois enviam os filhos para a metrópole para fazerem os seus estudos superiores, quando dispõem de politécnicos públicos e privados na sua área de residência? (Excluo, naturalmente, os casos em que a ausência de oferta formativa os obrigue a sair.)
Estas unidades de Ensino Superior estão hoje dotadas de todas as condições para a realização de um bom percurso académico, tanto em termos de estruturas como de qualidade do corpo docente, de investigação ou de capacidade de iniciativa para múltiplos projetos. E acrescentaria que quase todas estão já também a trabalhar a formação de estudantes internacionais.
As autarquias criaram – e bem – bolsas de apoio para estudantes de Ensino Superior da “terra” (como ainda se usa dizer). Pena que não sejam atribuídas apenas aos jovens que pretendam desenvolver os seus estudos nas instituições de ensino locais, pois, ao invés do expectável, uma parte substancial dos estudantes rumam às grandes cidades!
Frequentemente somos também confrontados com as notícias em jornais, rádios e televisões dos enormes custos que é arrendar um simples quarto, a que se juntam as despesas com viagens e alimentação, entre outras. Tudo isto poderia ser evitável, em boa parte dos casos, se algumas mentes não se entretivessem a desprestigiar e colocar em causa a qualidade do ensino que as instituições do Interior têm – e que, não raro, já é reconhecida além-fronteiras.
Posso depreender que as queixas referentes à dificuldade de arranjar quarto e aos custos que um jovem tem ao ir estudar para Lisboa ou Porto não passam de uma enorme falha no cálculo das despesas. Ou, então, será a “vaidade” a impor-se ao poder de compra disponível e, quando assim é, a reivindicação é o caminho.
O que deveria ser feito é justamente o oposto: dar benefícios aos jovens que fossem do Litoral estudar para o Interior. Provavelmente, alguns deles, após terminarem a respetiva formação académica, até estariam mais disponíveis e recetivos a fixarem-se na região. Com isso, contribuiriam para o seu desenvolvimento, recuperar-se-iam casas devolutas, criavam-se negócios, geravam-se postos de trabalho, a economia local crescia, equilibrava-se a balança entre o Litoral e o Interior, tornando o país mais homogéneo.
O Interior merece voltar a ter vida!