No passado dia 14 de novembro, para assinalar o Dia Mundial da Diabetes, o Serviço de Medicina Interna do Hospital da Misericórdia de Évora, Rede Hospital da Luz, em colaboração com o Departamento de Ciências Médicas e da Saúde da Universidade de Évora, organizou duas iniciativas complementares dedicadas à sensibilização para a diabetes. Durante o dia decorreu um rastreio gratuito no Évora Plaza, dirigido à população, com o intuito de consciencializar as pessoas sobre a Diabetes e divulgar as ferramentas necessárias para a sua prevenção, monitorização, ensino de autocuidados e gestão de fatores de risco. Participaram 64 pessoas no rastreio, maioritariamente mulheres (53%), com uma média de idades de 55 anos (mínimo 18 e máximo 93 anos). Entre os participantes, 14% tinham diagnóstico prévio de diabetes, sendo a maioria do sexo masculino (67%) e com uma média de idades de 63 anos. Comparando este grupo com a população total do rastreio, verificou-se um risco metabólico superior, evidenciado pelo maior perímetro abdominal médio (102,2 cm nas pessoas com diabetes, face a 92,6 cm na ausência de diabetes). No conjunto total dos participantes, mais de metade (54,6%) apresentava excesso de peso ou obesidade. Do rastreio resultou o aconselhamento de 26 pessoas (40,6%) para avaliação médica em consulta; destas, 4 foram referenciadas para consulta de Diabetes, enquanto as restantes foram encaminhadas para controlo de outros fatores de risco cardiovasculares identificados, nomeadamente obesidade, tabagismo ou hipertensão arterial não controlada.
Em simultâneo, no Palácio do Vimioso teve lugar o evento aberto ao público “Saúde em Diálogo: vamos cuidar da diabetes juntos”, uma iniciativa dedicada a quem vive com diabetes, familiares, cuidadores e toda a comunidade interessada em saúde. Foi uma oportunidade única para ouvir especialistas, esclarecer dúvidas, entender melhor a doença e conhecer novas abordagens para o cuidado e o autocuidado.
A relevância destas iniciativas torna-se particularmente evidente quando confrontada com os dados do Observatório Nacional da Diabetes. Segundo o relatório mais recente, Diabetes: Factos e Números – Relatório Anual 2024 [1], a prevalência de diabetes na população portuguesa entre os 20 e os 79 anos atingiu 14,2%, o valor mais elevado alguma vez registado. Isto corresponde a mais de 1 milhão de portugueses a viver com a doença. O relatório destaca ainda que 44% dos casos de diabetes tipo 2 permanecem por diagnosticar, reforçando a existência de uma epidemia silenciosa e subestimada [1]. Do ponto de vista económico, a Sociedade Portuguesa da Diabetologia estima que os custos diretos anuais da diabetes variem entre 1500 e 1800 milhões de euros, correspondendo a 0,5–0,6% do PIB e 5–6% da despesa total em saúde [1]. Responder a esta realidade exige uma abordagem integrada, para além da prática clínica tradicional. A terapêutica atual inclui insulina, fármacos orais e injetáveis, bem como tecnologias avançadas como sensores contínuos de glicose e bombas de insulina, que transformaram o controlo metabólico. No campo da biomedicina, emergem sensores mais precisos, algoritmos de inteligência artificial capazes de analisar padrões glicémicos e modelos estatísticos avançados que permitem antecipar hipoglicemias e personalizar terapias — em total coerência com a evolução recente dos sistemas de monitorização contínua. As ciências farmacêuticas têm contribuído para o desenvolvimento de novas moléculas, terapias combinadas e sistemas de administração inteligentes que melhoram a adesão ao tratamento. Já na área do desporto e da saúde pública, o exercício físico deve ser encarado como intervenção terapêutica central. Programas individualizados, apoiados por ferramentas digitais e modelos preditivos, podem melhorar a sensibilidade à insulina e reduzir complicações futuras. Simultaneamente, reforçar o rastreio, integrar dados entre setores público e privado e investir em educação em saúde é essencial para combater o subdiagnóstico. A diabetes deve ser tratada como uma prioridade estratégica para o país. Não basta reagir; é necessário antecipar. Investir em prevenção, investigação translacional e sistemas integrados de informação é investir no futuro do SNS e na qualidade de vida de milhões de portugueses. A ciência, a clínica e a comunidade já mostraram capacidade de ação conjunta — agora é tempo de transformar este conhecimento em política de saúde sustentada.
Referências
[1]. Sociedade Portuguesa de Diabetologia. (2025). Diabetes: Factos e Números – Relatório Anual do Observatório Nacional da Diabetes 2024. Observatório Nacional da Diabetes. http://www.spd.pt