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Diretor Fundador: João Ruivo Diretor: João Carrega Ano: XXVII

Opinião Que modelo para a avaliação da docência?

Quanto a esta matéria, ciclicamente, regressa-se ao mesmo ponto de partida, porque as propostas que circulam nos corredores da política educativa e sindical são contraditórias e com um elevado grau de imprevisibilidade. Parece que venceu o desencanto e já só se buscam soluções de remedeio, para que todos os intervenientes na negociação deste processo alcancem uma saída honrosa.

A ser verdade, é pena. Já aqui demonstrámos que a avaliação de um professor não pode servir apenas para filtragem na progressão da carreira e controle orçamental. Bem pelo contrário: a avaliação de um professor é uma actividade que se projecta no futuro. Conhecidos que forem os resultados da avaliação, tudo, ou quase tudo está por fazer. É com base nos dados recolhidos pelo avaliador e pelo avaliado que se traçam as grandes linhas de actuação que estão para vir. Ou seja, as actividades de melhoramento ou de alteração do desempenho do professor começam precisamente aí. Por isso mesmo, o resultado da avaliação deve ser encarado como uma variável de presságio que, em contínua espiral de evolução, deve acompanhar toda a carreira do docente, adaptando-se às necessidades pressentidas em cada um dos diferentes estádios profissionais que ele atravessa.

O processo de avaliação, assim entendido, terá de merecer uma aceitação indiscutível por parte de avaliadores e de avaliados e não pode estar sujeito a hipocrisias burocrático administrativas. Até porque o professor, em determinadas situações avaliador de si próprio, deve contribuir para que, progressivamente, sinta que é dispensável a ajuda externa dos seus supervisores, já que a avaliação deve encaminhá-lo para estádios de mestria, e para progressivos níveis de excelência, conferidos pelo auto-controle e pela auto-formação. Nestes contextos a classificação pode até ser um prescindível elemento da avaliação. Daí que se diga que o principal objectivo do supervisor é… tornar-se dispensável.

Em Portugal continuamos a viver momentos de pura incapacidade de decisão sobre este assunto. Há quem entenda que a implementação séria de um modelo de avaliação dos professores é, prioritariamente, tarefa administrativa, resultando apenas de progressivos consensos gerados à mesa de negociações.

E, de todo, não o é! Pelas implicações pessoais e profissionais que pode provocar, um modelo de avaliação de professores é coisa muitíssimo mais séria. Tem de contemplar a soma das actividades em que ele se desdobra e em que se envolve. Logo, deve apreciar o professor enquanto profissional, mas também como pessoa, como membro de uma comunidade, como técnico qualificado no talento de ensinar e como especialista das matérias que ensina. Portanto, requer a intervenção, desde logo dele próprio, mas também de outros agentes que sobre ele se pronunciam. E todos esses intervenientes do processo avaliativo, para que consigam alcançar o exercício pleno da sua missão, carecem de uma formação específica e especializada em supervisão e em observação de actos pedagógicos.

Na sociedade do conhecimento e da informação, requer-se também a elaboração de uma rede de comunicações, em que as plataformas digitais de comunicação a distância tenham lugar de destaque. Como tal, deve-se promover o recurso à hetero-observação entre pares, à autoscopia, à vídeo-conferência e à circulação de portefólios digitais, enquanto recursos, meios e produtos indispensáveis ao desenvolvimento de docentes que, diariamente, lidam com jovens da geração Z.

 Um sistema como o que descrevemos também requer tempo para ser testado e validado, antes de ser generalizado. Impõe uma escolha criteriosa das escolas que irão constituir a amostra, bem como dos instrumentos e dos agentes que vão avaliar esse pré-teste. Obriga a uma escolha prudente dos futuros avaliadores, após se ter procedido ao estabelecimento de um perfil desses supervisores. Impõe a rápida formação dos professores e dos seus avaliadores… Isto é, a implementação de um tal sistema requer tempo e a afectação generosa de recursos humanos e financeiros.

Infelizmente, não me parece ser este o caminho que está a ser escolhido. Provavelmente seremos confrontados com propostas que não passam de mais uma tentativa de oferecer uma reforma semântica, ou a criação de mais um sistema burocrático.

Sabemos que se traçam-se cenários que tudo têm a ver com a busca de uma solução política que ultrapasse o quadro de descontentamento que se apoderou das nossas escolas. Mas, reconheça-se que, se nessa fotografia ninguém quiser ficar mal, esses cenários pouco terão que ver com as merecidas vitórias por que tanto e tão dignamente têm lutado os nossos professores.

João Ruivo
ruivo@rvj.pt

Este texto não segue o novo Acordo Ortográfico