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Diretor Fundador: João Ruivo Diretor: João Carrega Ano: XXVII

Opinião A inigualável nobreza da profissão docente

Vivemos uma época de rápidas mudanças e clivagens abruptas, de tal modo que passámos, vertiginosamente, da aldeia global à megalópolis do imprevisível.
Profundas alterações nos saberes, na organização das forças produtivas e nas tecnologias da comunicação e da informação apresentam-nos o longe cada vez mais perto e obrigam-nos a uma partilha global das matérias-primas, dos bens de consumo, dos padrões culturais e das políticas, as boas e as más, enquadrantes da designada economia de mercado.
Neste acelerado rumar da história, a escola pública de massas passou a ser um elo frágil, fácil de atacar pelos poderes constituídos, e a quem o Estado, as famílias e as organizações sociais atribuem cada vez mais competências e responsabilidades, por reconhecerem ser incapazes de as assumir e monitorizar.
Quem sabe se não estremos próximos do fim da “escola compensatória”, uma das maiores utopias herdadas das grandes convulsões sociais e culturais vividas na década de sessenta do passado século.
A escola universalizou-se, promoveu o progresso e o bem-estar das populações, qualificou os cidadãos, tornou o mundo mais compreensivo e devolveu a dignidade da cidadania a muitas nações. Promoveu o progresso, combateu a ignorância e a opressão que vive na sua sombra. Pôs-nos mais perto de outros universos e ensinou-nos a odiar a palavra exclusão. Mas não conseguiu inverter a marcha de “compensar” ainda mais os já “compensados”, permitindo que dentro das suas paredes se continuem a desenvolver mecanismos que reproduzem as desigualdades e as iliteracias, já que à desigualdade no acesso raramente ocorre uma promoção da igualdade no processo.
Aquele aumento de tarefas e funções que a sociedade e o Estado aportam à escola tem resultado numa desactualização permanente dos professores, das instituições e dos curricula em que estes são formados.
Neste quadro, a maioria dos professores resistem e recusam perder a sua profissionalidade. Querem estar presentes e aceitam os novos desafios, apesar de enfrentarem, diariamente, o embate das mudanças, das pressões e das críticas injustas, por vezes acumuladas por mais de uma geração, e vindo de onde menos seriam esperadas.
O que é, então ser professor hoje? Como podemos definir a sua identidade e a sua profissionalidade?
Temos, repetidamente, afirmado que se é primeiro professor e, só depois, e por causa disso, é que se pode ser professor de alguma coisa.
É-se primeiro professor porque se partilham uma identidade e uma cultura profissionais. Porque se comungam posturas e princípios éticos. Porque se lhes atribuem modos de acção e desempenhos normalizados…
Poderíamos definir, então, a profissionalidade dos docentes em torno de seis vectores que, nos últimos tempos, temos visto injustamente deturpados e atacados:
Primeiro: frequência de uma formação formal, organizada e que configura a aprendizagem de um conjunto de saberes em diferentes momentos do percurso profissional (saberes de formação e saberes de experiência), formação essa que conduz ao domínio de determinadas competências instrumentais.
Segundo: A prática, num determinado espaço e durante um certo tempo, de um conjunto de tarefas socialmente validadas.
Terceiro: O exercício de uma profissão reconhecida como meritocrática e certificada pelo Estado.
Quarto: O direito a uma remuneração permanente e supostamente equitativa.
Quinto: A manutenção de um estatuto social de referência.
Sexto: A assumpção de uma ética que deve configurar-se num código deontológico que determinasse e regulasse os direitos, obrigações, práticas e responsabilidades do exercício da profissão.
São seis vectores que, promovidos a um nível elevado de congruência, contribuem decisivamente para a melhoria da autoestima, da autoconfiança e do bem-estar profissionais, associados à eficácia do desempenho profissional. Assim soubessem os governos reconhecer a inigualável nobreza que constitui o exercício diário da profissão docente…

João Ruivo
ruivo@rvj.pt

Este texto não segue o novo Acordo Ortográfico