Harvard, nos Estados Unidos da América, assume-se como uma das melhores universidades do mundo. Por ali passaram 162 prémios Nobel. Este ano tem matriculados 6700 estudantes estrangeiros, o que corresponde a 27 por cento do número total de alunos. Esta diversidade e a busca de ter os melhores tornam a Universidade de Harvard como uma das mais desejadas pelos estudantes de todo o mundo, mas acima de tudo fazem dela um espaço de superlativo de conhecimento em que diferentes olhares e culturas fazem avançar o mundo.
A formação e a investigação ali produzidas, a par do reconhecimento internacional, pelos pares, e a perceção que o mundo tem da Universidade de Harvard e de outras como Yale, Brown, Princeton ou Johns Hopkins, deveriam ser motivo de orgulho e uma bandeira para os Estados Unidos. Ao invés, a administração de Donald Trump, que como lema adotou a expressão “tornar a América grande novamente”, decidiu em sentido contrário: torná-la mais pequena ao atacar as suas instituições universitárias, mas também as estrangeiras, como aconteceu com algumas portuguesas a quem lhes foi exigido esclarecimentos sobre se estas têm relações com entidades associadas a partidos comunistas, socialistas ou totalitaristas, e que medidas adotam as universidades portuguesas para preservar as mulheres das ideologias de género. A resposta das nossas academias que tinham aderido ao programa “American Corner” - um projeto que tem permitido, num espaço próprio, a realização de palestras, conferências e atividades de cariz científico - foi clara: não respondemos e não admitimos interferências.
Harvard, com riscos maiores associados, fez o mesmo. Trump respondeu com músculo autoritário impróprio dos regimes democráticos: cortou mais de dois mil milhões de dólares em bolsas para a universidade, interrompendo alguns programas de investigação e retirou o direito de uma das mais prestigiadas universidades do mundo acolher estudantes internacionais. Harvard agiu judicialmente e um juiz suspendeu a medida. Horas de antes escrever este artigo, Donald Trump publicou na sua própria rede social (Truth Social) e que a Lusa reproduziu, o seguinte: “Queremos saber quem são estes estudantes internacionais, um pedido razoável, uma vez que damos milhares de milhões de dólares a Harvard, mas Harvard não é propriamente transparente”. Pediu ainda à universidade que “pare de pedir dinheiro ao Governo federal”.
A independência financeira da Universidade de Harvard - e é dela que se fala - permite-lhe ser intransigente e afastar qualquer tipo de interferência externa, mesmo do presidente do país mais poderoso do mundo. Outras, menos robustas, e com menos argumentos, não o conseguirão fazer.
Esta pressão autoritária sobre as universidades é perigosa. As ameaças com que as academias têm sido confrontadas vai ao encontro da política atual norte americana aplicada em diferentes setores: economia - com as taxas de importação sobre os produtos a subirem para níveis inimagináveis -, na defesa - veja-se os conflitos na Ucrânia e em Gaza, bem como a postura adotada na NATO -, na saúde - com a retirada dos Estados Unidos da Organização Mundial de Saúde; ou ainda na ajuda humanitária - com a suspensão de subsídios a serviços humanitários. Em todos eles a América sempre foi grande e ponderada. Aquilo que se deseja é que o Mundo saiba interpretar estes sinais e possa responder com inteligência.
Este conflito entre Harvard e a administração norte americana será prejudicial, sobretudo, para os Estados Unidos. Há outras universidades - sobretudo na Europa - desejosas de acolher muitos dos seus distintos estudantes internacionais. Universidades que, como Harvard, são também das melhores do mundo, em diferentes áreas, e que poderão ver neste processo um novo caminho, criando oportunidades para quem quer prosseguir estudos e fazer investigação. A Europa tem uma palavra a dizer e as suas instituições de ensino superior, mesmo que solidárias com Harvard com quem certamente terão parcerias, devem olhar para o momento com atenção e oportunidade. A ciência só avança com os melhores e não será o decreto da administração americana em proibir o acolhimento de estudantes internacionais que vai impedir os estudantes e investigadores de procurarem outras academias. E, a médio-prazo, a concretizar-se essa mudança, há todo um setor económico ligado à investigação e à inovação que também procurará ficar junto das casas do saber.