A equipa RED | Rocket Experimental Division, do Instituto Superior Técnico, venceu o Prémio motor sólido 3000 metros na terceira edição do EuRoC – European Rocketry Challenge, a primeira competição universitária de lançamento de foguetes na Europa, que decorreu em Ponte de Sor (no âmbito do Portugal Air Summit) e no Campo Militar de Santa Margarida, de 11 a 18 de outubro.
Promovido pela Agência Espacial Portuguesa – Portugal Space, o concurso reuniu 18 equipas de 11 países, 500 estudantes, muita ousadia, ciência, tecnologia e capacidade de criar. Mas também muito trabalho.
Na competiação, a equipa italiana seria a grande vencedora ao conquistar os prémios EuRoC; Melhor relatório Técnico; e ANACOM, para a melhor ocupação espectral. A equipa Aeroespace Team Graz, da Áustria, conquistou os prémios New Space e de Equipa, enquanto os britânicos do projeto Endeavour foram distinguidos com o Prémio Playload, patrocinado pela Agência Espacial Europeia. Nas diferentes categorias de motores em prova, sagraram-se campeãs, além da equipa nacional, as equipas: TU Wien Space Team (Áustria), com prémio motor líquido 3000 metros; e EPFL Rocket Team (Suíça), com Prémio motor sólido 9000 metros.
A aventura de fazer aterrar
o primeiro rocket português
A três dias do lançamento do foguete (leia-se rocket, missil ou pequeno foguetão) a equipa portuguesa faz os últimos ajustes nas boxes instaladas no aeródromo de Ponte de Sor, onde decorreu o Portugal Air Summit. “No ano passado já participámos na competição. Este ano viemos com o Baltazar (nome do foguete), que está mais otimizado a nível eletrónico. O objetivo é lançá-lo até aos três mil metros exatos e fazer regressar metade da estrutura em segurança”, referem Carmen Fonseca e Pedro Rosado, respetivamente diretora técnica e coordenador do projeto RED.
Momentos antes, Elvira Fortunato, ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, visita espaço onde as equipas inscritas fazem os últimos ajustes para os lançamentos que serão feitos a partir do Campo Militar de Santa Margarida, ao longo dos três dias e com todas as medidas de segurança. “A ciência que temos em Portugal é muito boa, em algumas áreas é excelente, aliás, nós damos cartas a nível internacional”, sublinha a também investigadora portuguesa, nomeada por duas vezes para o prémio Nobel.
“Para além do desenvolvimento dos foguetes também fazemos outros projetos. Queremos aterrar em segurança o primeiro rocket português. Por isso, o Baltazar está equipado com dois paraquedas (um mais pequeno que abrirá aos três mil metros de altitude e outro, maior, que será ativado aos 400 metros)”, esclarecem.
No projeto RED surge outra inovação: “o foguete tem aquilo a que chamamos travões aéreos, para que não seja excedida a altitude dos três quilómetros”, revelam Carmen Fonseca e Pedro Rosado, enquanto respondem também às questões que são colocadas pelo presidente da ANACOM – Autoridade Nacional de Comunicações, João Cadete de Matos, que nos acompanha na visita às “oficinas” das equipas a concurso.
“Queremos ser pioneiros em tecnologia espacial e fazer a ligação entre a academia e as empresas”, reafirmam os líderes de uma equipa composta por 60 estudantes do Instituto Superior Técnico, de várias áreas formativas. “É um desafio enorme conciliar as aulas com o projeto, o que exige profissionalismo. Temos uma grande paixão em aplicar a teoria à prática”, acrescentam.
O lançamento acaba por ocorrer na manhã de sábado. “Estamos muito orgulhosos”, disse Pedro Rosado. A sensação de terem alcançado o objetivo que resulta de muitos meses de trabalho é “única”, contrastando com o de outras equipas que, por questões técnicas, não conseguiram lançar os seus foguetes, mas que ainda assim receberam a atenção e o incentivo de todos.
Uma portuguesa entre ingleses
A presença portuguesa nesta competição não se resumiu à equipa RED. É certo que a formação Fénix Rocket Team, que reunia estudantes da Universidade de Coimbra e da Universidade da Beira Interior, teve problemas técnicos e desistiu dois dias antes do início da competição. Mas no projeto britânico do Imperial College London, Lara Alves e João Matias, dois alunos portugueses, juntam o seu saber a um grupo com estudantes de diferentes países.
“Esta é uma equipa que já existe há alguns anos, pelo que os conhecimentos de anos anteriores são utilizados. Não começamos do zero”, diz Lara Alves, dois dias antes do lançamento do foguete britânico.
Nas boxes da equipa inglesa ultimam-se os ajustes finais. Lara Alves, que partiu para Inglaterra com o desejo de estudar no estrangeiro o mestrado integrado em Engenharia Aeronáutica, mostra-nos uma das novidades do projeto: “um paraquedas, com pequenos painéis solares, que irá equipar o rocket. No futuro esta tecnologia poderá ser incorporada no vestuário, permitindo por exemplo que se carregue o telemóvel a partir da roupa”.
Cumpre-se assim outro dos objetivos do concurso europeu, que passa também por “incentivar os alunos a estudar ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) e ao desenvolvimento de habilidades tecnológicas”, como revela a organização.
Aluna do 3º ano, trocou Setúbal por Londres. Lara Alves confessa estar satisfeita. “Está a ser uma experiência muito boa. Tentei escolher as melhores escolas desta área”. O projeto inclui alunos de várias áreas como o aeroespacial, informática, química ou eletrónica.”Temos como objetivo lançar o foguete até aos três quilómetros de altura. A missão consiste também em fazer regressar em segurança metade do foguete”, explica.
Problemas de telemetria acabam por deixar o foguete em terra. Agora há que analisar o que correu mal. Tudo faz parte da aprendizagem.
Marta Gonçalves, Agência Espacial Portuguesa
Oportunidade para o mundo do trabalho
O EuRoc para além de estimular os estudantes de engenharia a projetar, construir e lançar seus próprios veículos, constitui uma oportunidade para os estudantes contactarem com as empresas que estão no setor aeroespacial. “Os patrocinadores da iniciativa são atores do setor que aqui vêm buscar talentos para se juntarem às suas empresas”, justifica Marta Gonçalves, gestora de projetos da área da ciência e educação, da Agência Espacial Portuguesa.
A também coordenadora do concurso fala ao Ensino Magazine no Campo Militar de Santa Margarida, momentos antes de se iniciarem mais três lançamentos. Na base as equipas colocam os seus foguetes na estrutura de lançamento. “Esta é a edição que está a correr melhor. A experiência ajuda”, diz, enquanto lembra que das 43 candidaturas, foram admitidas 25 equipas no concurso, tendo desistido sete.
A bandeira amarela, que garante alguma liberdade de circulação na zona de lançamentos, está quase a ser substituída por outra de cor vermelha, que obriga todos os presentes a irem para uma área de segurança e a abandonar a bancada existente. “Hoje em dia a questão do espaço está a tomar outro fôlego. No setor espacial há uma mudança de paradigma, os investimentos estão a passar da parte governamental para o setor comercial. Ouve-se falar cada vez mais do espaço e isso gera interesse junto dos jovens. O próprio setor espacial está a ganhar uma nova dinâmica, com o aparecimento de novos atores”, acrescenta Marta Gonçalves.
O entusiasmo entre público, restrito, que se encontra no local é grande. Para os estudantes é um misto de apreensão e confiança no foguete que querem lançar. “O que tentamos fazer com este concurso é aproximar os jovens e o público em geral «do espaço». É verdade que todos, em criança, olhamos para o espaço e temos um grande fascínio por ele. Mas também é verdade que isso se vai esbatendo à medida que crescemos, devido à sua complexidade. Ao fazermos esta iniciativa dizemos aos estudantes universitários que estando numa equipa é possível construir um foguete e estar junto deste setor”, reafirma.
A bandeira vermelha toma conta do campo de lançamento e uma forte buzina dá o sinal sonoro. Depois vem a contagem descrescente. A maioria dos foguetes cumpre a sua missão. A competição encerra de forma positiva. “Estou certo de que juntos, no futuro, iremos fazer história no contexto europeu e também mundial”, frisa Eduardo Ferreira, vice-presidente da Agência Espacial Portuguesa, na sessão de encerramento do evento. “É importante dar espaço às vossas ambições enquanto futuros profissionais do setor, bem como à nossa missão como Agência Espacial. Desde 2020, é notória a forma como evoluímos e isso só é possível graças a todas as pessoas envolvidas na organização deste concurso, mas, obviamente, devido ao vosso empenho e dedicação”, conclui, agora em nota enviada ao Ensino Magazine, garantindo que a edição de 2023 está já a ser preparada.